Ordinários

por Caroline Yamasaki

Ordinários do La Mínima nos leva ao campo de batalha. Durante os 70 minutos de espetáculo, somos cúmplices das inseguranças, incertezas e refúgios de sobrevivência de três soldados na guerra. Logo no início somos apresentados a três personas distintas e não convencionais, em se tratando de militares. Filipe Bregantim, Fernando Paz e Fernando Sampaio,  o comandante, o intelectual e o que tem fome e acreditou que pelo menos em campo teria acesso à comida. Em treinamento e à espera de sua missão conhecemos a dinâmica dos três, o comandante, orgulhoso soldado, incentiva o treinamento mesmo tendo em sua tropa dois soldados não tão aptos ao ofício. Chefe e esfomeado entram em atrito a cada sacanagem que o que tem fome prega, e nestes momentos temos acesso à suas vidas fora do campo. O intelectual pontualmente aproveita essas oportunidades para acalmar os ânimos dos companheiros através da leitura de cartas que misteriosamente recebe. Enviadas por parentes, trazem mensagens nostálgicas, afetuosas e no limite indiscretas, nos revelando seu potencial poético e as fragilidades dos companheiros.

A jornada de treinamento acaba quando recebem a missão de resgatar o general capturado. Na fronteira com o território inimigo se deparam com uma trupe de artistas mortos e seus instrumentos abandonados. Neste ponto, os soldados improváveis têm uma decisão a tomar: avançar enquanto exército em combate ou travestidos de artistas. Se anteriormente já havíamos experimentado a potência da palhaçaria do La Mínima, neste momento o trio tem a deixa para escancarar ao que vieram. 

A plateia é deslocada ao papel do exército inimigo e um show de ventríloco acontece para nos fazer rir, escancarando os horrores que as guerras e as armas trazem, tudo em prol do capital – uma crítica às guerras e ao momento político em que vivemos, este flerte e desejo armamentista brasileiro. Nossos soldados identificam que seu general virou a casaca, toda sua jornada se mostra em vão e suas vidas expostas ao perigo. Em um truque de mágica se deslocam de lá e voltamos à campo com os três, sem motivação para seguirem em combate mas cercados pela guerra de qualquer maneira. Não há saída. 

Vale ressaltar que este espetáculo foi inspirado na experiência da companhia com a ONG Palhaços sem fronteira, atuante em áreas de conflito.

A encenação preenche o palco e envolve a plateia por completo. Elementos cênicos extremamente funcionais, um desenho de luz preciso e sons incidentais auxiliam essas três potências em cena a contar essa história de aflição cômica.

Texto produzido durante o laboratório (Dis)Parem as máquinas! – fundamentos e práticas de crítica circense, sob supervisão de Maria Carolina Vasconcelos Oliveira.

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